SOLENIDADE DA EPIFANIA DO SENHOR 2021 ANO B
A análise
dos vários detalhes do relato confirma que a preocupação do autor (Mateus) não
é de tipo histórico, mas catequético.
Notemos, em primeiro lugar, a insistência de Mateus no facto de Jesus ter
nascido em Belém de Judá (cf. vers. 1.5.6.7). Para entender esta insistência,
temos de recordar que Belém era a terra natal do rei David e que era a Belém
que estava ligada a família de David. Afirmar que Jesus nasceu em Belém é
ligá-l’O a esses anúncios proféticos que falavam do Messias como o descendente
de David que havia de nascer em Belém (cf. Mi 5,1.3; 2 Sm 5,2) e restaurar o
reino ideal de seu pai. Com esta nota, Mateus quer aquietar aqueles que
pensavam que Jesus tinha nascido em Nazaré e que viam nisso um obstáculo para o
reconhecerem como o Messias libertador.
Notemos, em segundo lugar, a referência a uma estrela “especial” que apareceu
no céu por esta altura e que conduziu os “magos” para Belém. A interpretação
desta referência como histórica levou alguém a cálculos astronómicos
complicados para concluir que, no ano 6 a.C., uma conjunção de planetas
explicaria o fenómeno luminoso da estrela refulgente mencionada por Mateus;
outros andaram à procura de um cometa que, por esta época, devia ter sulcado os
céus do antigo Médio Oriente… Na realidade, é inútil procurar nos céus a
estrela ou cometa em causa, pois Mateus não está a narrar factos históricos.
Segundo a crença popular da época, o nascimento de uma personagem importante
era acompanhado da aparição de uma nova estrela. Também a tradição judaica
anunciava o Messias como a estrela que surge de Jacob (cf. Nm 24,17). Ora, é
com estes elementos que a imaginação de Mateus, posta ao serviço da catequese,
vai inventar a “estrela”. Mateus está, sobretudo, interessado em fornecer aos
cristãos da sua comunidade argumentos seguros para rebater aqueles que negavam
que Jesus era esse Messias esperado.
Temos ainda as figuras dos “magos”. A palavra grega “mágos”, usada por Mateus,
abarca um vasto leque de significados e é aplicada a personagens muito
diversas: mágicos, feiticeiros, charlatães, sacerdotes persas, propagandistas
religiosos… Aqui, poderia designar astrólogos mesopotâmios, em contacto com o
messianismo judaico. Seja como for, esses “magos” representam, na catequese de
Mateus, esses povos estrangeiros de que falava a primeira leitura (cf. Is
60,1-6), que se põem a caminho de Jerusalém com as suas riquezas (ouro e
incenso) para encontrar a luz salvadora de Deus que brilha sobre a cidade
santa. Jesus é, na opinião de Mateus e da catequese da Igreja primitiva, essa
“luz”.
Além de uma catequese sobre Jesus, este relato recolhe, de forma paradigmática,
duas atitudes que se vão repetir ao longo de todo o Evangelho: o Povo de Israel
rejeita Jesus, enquanto que os “magos” do oriente (que são pagãos) O adoram;
Herodes e Jerusalém “ficam perturbados” diante da notícia do nascimento do
menino e planeiam a sua morte, enquanto que os pagãos sentem uma grande alegria
e reconhecem em Jesus o seu salvador.
Mateus anuncia, desta forma, que Jesus vai ser rejeitado pelo seu Povo; mas vai
ser acolhido pelos pagãos, que entrarão a fazer parte do novo Povo de Deus. O
itinerário seguido pelos “magos” reflete a caminhada que os pagãos percorreram
para encontrar Jesus: estão atentos aos sinais (estrela), percebem que Jesus é
a luz que traz a salvação, põem-se decididamente a caminho para O encontrar,
perguntam aos judeus – que conhecem as Escrituras – o que fazer, encontram
Jesus e adoram-n’O como “o Senhor”. É muito possível que um grande número de
pagãos-cristãos da comunidade de Mateus descobrisse neste relato as etapas do
seu próprio caminho em direção a Jesus.
ATUALIZAÇÃO
Considerar
as seguintes questões:
• Em
primeiro lugar, meditemos nas atitudes das várias personagens que Mateus nos
apresenta em confronto com Jesus: os “magos”, Herodes, os príncipes dos
sacerdotes e os escribas do povo… Diante de Jesus, o libertador enviado por Deus,
estes distintos personagens assumem atitudes diversas, que vão desde a adoração
(os “magos”), até à rejeição total (Herodes), passando pela indiferença (os
sacerdotes e os escribas: nenhum deles se preocupou em ir ao encontro desse
Messias que eles conheciam bem dos textos sagrados). Identificamo-nos com algum
destes grupos? Não é fácil “conhecer as Escrituras”, como profissionais da
religião e, depois, deixar que as propostas e os valores de Jesus nos passem ao
lado?
• Os
“magos” são apresentados como os “homens dos sinais”, que sabem ver na
“estrela” o sinal da chegada da libertação...
Somos pessoas atentas aos “sinais” – isto é,
somos capazes de ler os acontecimentos da nossa história e da nossa vida à luz
de Deus? Procuramos perceber nos “sinais” que aparecem no nosso caminho a
vontade de Deus?
•
Impressiona também, no relato de Mateus, a “desinstalação” dos “magos”: viram a
“estrela”, deixaram tudo, arriscaram tudo e vieram procurar Jesus. Somos
capazes da mesma atitude de desinstalação, ou estamos demasiado agarrados ao
nosso sofá, ao nosso colchão especial, à nossa televisão, à nossa aparelhagem,
ao nosso computador? Somos capazes de deixar tudo para responder aos apelos que
Jesus nos faz através dos irmãos?
• Os
“magos” representam os homens de todo o mundo que vão ao encontro de Cristo,
que acolhem a proposta libertadora que Ele traz e que se prostram diante d’Ele.
É a imagem da Igreja – essa família de irmãos, constituída por gente de muitas
cores e raças, que aderem a Jesus e que O reconhecem como o seu Senhor.
ALGUMAS
SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O DOMINGO DA EPIFANIA
(adaptadas de “Signes d’aujourd’hui”)
1.
A
PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
Ao longo dos dias da
semana anterior ao Domingo da Epifania, procurar meditar a Palavra de Deus
deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo…
Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da
paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa
comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a
Palavra de Deus.
2.
PALAVRA
DE VIDA.
A caminho da estrela… Os magos tinham o hábito de perscrutar os astros. Eles
viram uma estrela, sem dúvida nova para os seus olhos, então puseram-se a
caminho… Aquele que procuravam parece querer fazer-se conhecer, um sinal basta
para estes magos. Param, experimentam uma grande alegria, prostram-se e
oferecem os seus presentes. A criança que eles descobrem não é uma criança como
as outras: é rei, então oferecem-lhe ouro; é Deus, então queimam incenso;
passará pela morte antes de ressuscitar, então apresentam a mirra. Para o
regresso, não têm necessidade de estrela. Deus convida-os a regressar por outro
caminho. O verdadeiro rei não é Herodes, mas esta criança que acaba de nascer.
3.
UM
PONTO DE ATENÇÃO.
Um convite ao acolhimento e à abertura… Festa da salvação para todos os povos,
a Epifania convida as comunidades cristãs ao acolhimento e à abertura. Como
viver isso concretamente hoje na celebração? Por exemplo, dando a cada um, ao chegar
à igreja, uma pequena estrela. Em cada uma, está escrito o nome de um dos
continentes: África, América, Ásia, Europa, Oceania. No fim da primeira leitura
que descreve em imagens sumptuosas Jerusalém como o cruzamento das nações, o
animador diz o nome África, depois América, e os outros; a cada apelo, aqueles
que têm o nome escrito na estrela levantam a estrela e mantêm-na levantada
durante o salmo responsorial. Em seguida, vão colocá-la no presépio.
4.
PARA
A SEMANA QUE SE SEGUE…
Aceitar pôr-se a caminho… Erguer os olhos: tal é o convite que nos é feito
hoje. Uma estrela brilha sempre na noite, se nós a perscrutamos com atenção.
Erguer os olhos: descentrar-se de si mesmo, procurar ajuda da parte de qualquer
outro, de Deus. Depois de ver a estrela, aceitar pôr-se a caminho. Nos próximos
dias, esta estrela será talvez uma caminhada a empreender para sair, encontrar
ajuda ou levar ajuda a alguém, tomar uma decisão até aqui adiada…
Fonte: https://www.dehonianos.org/portal/solenidade-da-epifania-do-senhor-ano-b/